Hoje em meio a camisas, camisetas, meias e
meiões, e meio corpo debruçado quase dentro da máquina de lavar [meço 1
metro e meio apenas, bem nem tanto assim 1,55], me vieram os pensamentos de
supetão: você não escreve mais você mesma...
Entre uma e outra peça pendurada no varal me dei
conta que é isso mesmo, não escrevo mais a mim mesma, não o que de fato se
atola em burburinhos que era outrora parido em letras e palavras, nem tão sutis
e lapidadas como hoje em dia.
Mas por quais motivos se deu que as coisas sejam
ainda coisas dentro de mim, mas virem à luz apenas um terço delas ou nem verem
a luz do monitor LCD deste laptop? A
censura.
A autocensura primeiramente. E depois a censura
que deu lugar a essa autocensura.
Você atualmente graças a todas essas redes
sociais não escreve mais para o outro, aqueles outros anônimos, ou nem
tanto, mas que lhe liam por ter com você empatias, similaridades, assim que
lessem o que eu cuspia, paria em letra não corria o risco de ser um choque, de
chocar, mas eis que as redes sociais que hoje aproximam mais céleres que um
segundo findado, trouxeram consigo a proximidade quase onisciente e onipresente
das relações parentais.
Então a escrita fica pela metade. Querendo ou não
eis a censura que gera a autocensura.
Em sã consciência você jamais escreverá as
lacunas perenes emanadas pela sua infância para que sogros, cunhados, irmãos,
pais leiam. Aonde já se viu ir rumo a um patíbulo certeiro de livre e
espontânea vontade? Em sã consciência ninguém vai.
Ou exporá em forma de poesia subterrânea suas
tresloucadas madrugadas rua afora, ou os corredores mil afora dos seus tempos
de primeira faculdade. Mesmo que tudo isso seja você. Mesmo que tudo isso possa
servir para alguma coisa depois de escrito. Você não escreverá sobre se a presença das redes sociais lhe
pesar.
O que vêm a ser engraçado na verdade, pois
mediante essas redes se pretende ser mais lido, mais notado, mais visto, porém
escrever com suas vísceras, derramar a bile que corrói a alma é outra coisa.
Assim pendurando as vestes da minha cria tornei
oficial para mim mesma essa verdade absoluta: eu hoje escrevo parcialmente, uma
parcial do que sou, uma metade do que há, aqui dentro.
E confesso me deu vontade de sentar e deixar cair
o pranto junto com o chuvisco que começava a se derramar dum céu escuro, quase
um roxo cinza zangado, pois terminei sendo o que jamais supus ser, alguém de
alguma forma pela metade, numa autoimposição castradora, ceifadora.
Usar codinomes, avatares é um artifício que se vê
em uso exatamente por quem como eu, não pode ser lida na íntegra, mas seria a
minha morte súbita se eu usasse esse recurso, pois odeio e sempre odiei
codinomes, avatares, meu nome, marca, codinome sempre foi um apenas: Luciana
Onofre. E só. E disso não abro mão.
Indo para trás na minha linha do tempo lembrei
que a decisão de ter/escrever um blog se deu exatamente quando eu estava
gerando minha primeira filha [ mais de 13 anos já passados] , para que
ela soubesse quem sou, quem fui, o quê eu era, logo a premissa era me jogar
inteira na letra, me verter, me traduzir em frases, constatações,
lembranças, [todas] não apenas as cores pasteis, mas sim meus mergulhos
soturnos, abissais, meus relatos sobre por aonde estes pés perambularam, o que
estes olhos viram, o que esta boca guarda... Ou seja, tudo é uma contradição,
pois decidi escrever para que minha prole me lesse, [eis umas das relações
parentais então] mas cá estou me lamentando pelo rumo que minha escrita teve.
Como gerenciar isso? É impossível mutar o olhar
alheio, pedir que se desfaça das prenoções, dos julgamentos, pedir que permitam
ao outro ser, escrever tal como ele é; sem máscaras. Então o que resta?
Irei dormir com essa questão certamente e
certamente acordarei com ela...
Luciana Onofre